19 de jul. de 2015

sacerdotes & levitas - algumas considerações


Às vezes nos deparamos com algumas coisas que parecem tão obviamente equivocadas que a nossa paciência e tolerância com estas situações facilmente se esgota. Quem já não passou por uma situação onde pensou que não valeria a pena conversar sobre um assunto com outra pessoa, pois ela não teria condições de compreender. A tentação é grande de simplesmente deixar para lá e tocar a vida. Afinal, quem, em sã consciência, procura sarna para se coçar?

No entanto, percebo que muitas vezes o que ocorre nestes momentos é que a outra pessoa, quem sabe, não teve acesso à formação e informação que a ajudaria a compreender a situação. Investir este tempo e, possivelmente, neste desgaste, é investir naquela pessoa e/ou naquela comunidade. Só não se pode esperar que uma semente brote de uma hora para outra e aprender isso tem me trazido mais paz. Muitas vezes me sentia frustrado ao tentar explicar algo que a pessoa não aceitava prontamente. Hoje em dia eu imagino quantas vezes eu já deixei (e continuo deixando) outras pessoas frustradas, pensando que não haviam me alcançado com a boa informação que estavam me passando, sendo que a mesma se tornou semente e brotou com o passar do tempo. Por mais que aquela pessoa não tenha visto o fruto na hora, aquela semente lançada se tornou benção para mim. E é isso que me dá coragem e motivação para escrever este texto.

Tenho a impressão que há uma certa confusão no uso das figuras e funções do Sacerdote e do Levita. Sacerdote é aquele que foi escolhido por Deus para fazer mediação entre Ele e o pecador no altar. Em outras palavras, é alguém que ajuda outros a compreenderem o plano da salvação que é revelado através dos sacrifícios. Eles apontavam para a expiação que haveria de ocorrer através do Cordeiro de Deus.

Já existiam sacerdotes antes do sacerdócio aarônico. O primeiro a ser chamado assim foi Melquezedeque. Outro foi Jairo, o sogro de Moisés. Todavia, pais de família já exerciam funções de sacerdócio ao oferecerem sacrifícios no altar como encontramos nos casos de Noé, Abraão e Jó.

O plano de Deus nunca foi que os sacerdotes fossem uma casta exclusiva e o texto tão conhecido de Pedro que fala do "sacerdócio real" (1Pe 2:9) é uma alusão a Ex 19:6 onde Deus diz ao Seu povo "vós me sereis reino de sacerdotes e nação santa". O plano original de Deus era que todo o Seu povo fosse composto de sacerdotes para fazer mediação entre Ele e as outras nações apontando para o plano da salvação. Pedro estava fazendo nada mais do que apontar para o que o próprio Deus havia declarado há tanto tempo (antes de instituir o sacerdócio aarônico, por sinal). Portanto, o sacerdócio pertence a todos que fazem parte do povo de Deus e a função do Seu povo é de compartilhar esta mensagem do sacrifício do Cordeiro. Fica claro que o plano de Deus para o sacerdócio sempre foi inclusivo e não exclusivo.

Infelizmente há aqueles que querem compreender o ministério pastoral como sendo a continuação do ministério sacerdotal. Espero que a explicação acima tenha deixado claro que isso não é uma opção. Esta interpretação, todavia, é compreensível, especialmente em países com forte herança católica. A teologia católica contemporânea depende profundamente da identificação do sacerdócio aarônico com o sacerdócio que ela pratica atualmente. Não é à toa que a nomenclatura que a Igreja Católica Romana usa é a mesma usada em relação ao santuário. Infelizmente esta visão se transferiu para denominações cristãs que não compartilham desta eclesiologia. Não é incomum encontrar pessoas que se referem à igreja como sendo templo ou santuário e não é de surpreender que a visão de sacerdócio exclusivo tenha se transferido para a função pastoral. Isto tem trazido sérias dificuldades para o dia-a-dia das Igrejas, pois coloca o pastor numa função que pertence a todo o povo de Deus.
Mas qual a função do pastor se ele não é o (único) sacerdote? Aqui vale a pena compreender a função do Levita.
A função do Levita surgiu quando a tribo de Levi se aliou a Moisés quando ocorreu a adoração do bezerro de ouro (Ex 32). Com a construção do Santuário eles passaram a cuidar da montagem, manutenção e transportação do mesmo, mas as suas funções modificaram e se expandiram ao chegarem na Terra Prometida. Mais tarde a função levítica enfatizou a Adoração e o Ensino (1Cr 6:31-32; 2Cr 17:9) [fonte: The Lexham Bible Dictionary, LEVITES]. Além destas funções de Adoração (mais especificamente Música) e Ensino eles também serviam como porteiros e guardas do Templo (1Cr 26), juízes (2Cr 19:8) e artesãos. É importante compreender que os levitas eram assalariados pelos seus serviços, e tinham a sua função determinada conforme os dons que eles demonstravam e desenvolviam. Eles viviam exclusivamente a serviço deste chamado e, portanto, viviam do dízimo do levirato. Os sacerdotes aarônicos recebiam o sustento deles do dízimo que era devolvido pelos Levitas.

Após analisar a função levítica me pergunto porque majoritariamente a função pastoral é assalariada através do dízimo atual e não outras funções, especialmente na Igreja local? Compreendo que não devemos transferir a função levítica diretamente para a nossa época e nem restringí-la somente às funções que são mencionadas na Bíblia. Vimos que a função do levita na Bíblia mudou de acordo com as circunstâncias. Todavia, não parece um pouco seletivo só assalariar sistematicamente uma destas funções que a Palavra nos apresenta?

Acredito que muitas coisas funcionariam bem melhor se em todas as instâncias, em especial na Igreja local, este conceito de levirato fosse aplicado. Aquele que foi chamado para servir de forma exclusiva com os seus dons em uma ou várias funções deveria ser sustentado pelo dízimo levítico (que é o dízimo atual, diga-se de passagem). Acredito que a Bíblia nos fornece um bom modelo que, aplicado de maneira contextualizada, poderá trazer muito mais benção ao trabalho do sacerdócio de todos os santos, o Seu povo, na sua missão de apresentar ao mundo que o Cordeiro de Deus já veio, que é chegado o Seu Reino e que Ele voltará para reinar para sempre.

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